{"id":77,"date":"2021-11-02T10:33:00","date_gmt":"2021-11-02T10:33:00","guid":{"rendered":"https:\/\/circulareconomy.pt\/blog-post-title-8\/"},"modified":"2023-06-30T12:27:31","modified_gmt":"2023-06-30T12:27:31","slug":"o-guarda-roupa-e-o-caixote-do-lixo-inquerito-sobre-a-responsabilidade-alargada-do-produtor-no-setor-textil","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/circulareconomy.pt\/en\/o-guarda-roupa-e-o-caixote-do-lixo-inquerito-sobre-a-responsabilidade-alargada-do-produtor-no-setor-textil\/","title":{"rendered":"O guarda-roupa e o caixote do lixo: inqu\u00e9rito sobre a Responsabilidade Alargada do Produtor no setor t\u00eaxtil"},"content":{"rendered":"
Os contornos legais do sistema ainda est\u00e3o por desenhar, mas a CEP reuniu algumas pistas.<\/strong><\/p>\n N\u00e3o creio ser uma consumidora desenfreada de roupa, mas ainda assim tenho roupa para dar e vender. O meu filho cresce e a roupa deixa de lhe servir; h\u00e1 camisolas minhas que v\u00e3o murchando com o uso e que permanecem dobradinhas na gaveta… De vez em quando fa\u00e7o uma sele\u00e7\u00e3o. Vendo o que est\u00e1 em melhores condi\u00e7\u00f5es (sou f\u00e3 da Kid to Kid<\/em>) e deposito o restante num contentor da C\u00e1ritas. Sei (at\u00e9 certo ponto) o que acontece a estes artigos \u2013 visitei em Rio de Mouro o armaz\u00e9m da Cooperativa Esperan\u00e7a, a estrutura que processa os materiais recolhidos nestes contentores. Alguma roupa \u00e9 usada pela C\u00e1ritas nas suas atividades de a\u00e7\u00e3o social, mas a grande maioria do t\u00eaxtil \u00e9 exportado, sobretudo para o M\u00e9dio Oriente.<\/p>\n Contentores como os da C\u00e1ritas (que podem pertencer a organiza\u00e7\u00f5es da economia social ou a empresas comerciais) existem um pouco por todo o pa\u00eds, ainda que com maior densidade nos grandes centros urbanos. Apesar disso, muita roupa acaba no lixo indiferenciado. Foram 171 mil toneladas em 2019, representando 4,27% da totalidade dos res\u00edduos n\u00e3o recolhidos seletivamente em Portugal Continental (c\u00e1lculo efetuado a partir de dados da Ag\u00eancia Portuguesa do Ambiente).<\/p>\n \u00c9 para dar a volta a esta situa\u00e7\u00e3o que a lei n.\u00ba 52\/2021 prev\u00ea que os t\u00eaxteis sejam englobados num sistema de responsabilidade alargada do produtor (RAP) \u2013 semelhante ao j\u00e1 existente para fluxos como o das embalagens ou o dos equipamentos el\u00e9tricos e eletr\u00f3nicos.<\/p>\n Os fabricantes de roupa passam a ser respons\u00e1veis pelos res\u00edduos? Como assim?<\/strong><\/p>\n Os contornos do futuro sistema ainda est\u00e3o por definir. No caso das embalagens, existem diferentes entidades gestoras que cobram aos produtores e distribuidores uma taxa (\u201cecovalor\u201d), financiando assim as atividades de recolha seletiva e triagem que potenciam a reciclagem dos materiais. Equaciona-se agora a modula\u00e7\u00e3o desse ecovalor, no sentido de premiar as embalagens \u201cboas\u201d (com certo teor de material reciclado, por exemplo) e penalizar as \u201cm\u00e1s\u201d.<\/p>\n Para o t\u00eaxtil, poder\u00e1 vir a haver exonera\u00e7\u00e3o do ecovalor caso o vestu\u00e1rio respeite certos crit\u00e9rios ambientais. Segundo a APA, o Governo tem at\u00e9 final de 2022 para estudar \u201ca introdu\u00e7\u00e3o de um sistema de verifica\u00e7\u00e3o e autentifica\u00e7\u00e3o da durabilidade dos bens t\u00eaxteis\u201d, podendo eventualmente, \u201cno caso de esta se verificar, exclu\u00ed-los das obriga\u00e7\u00f5es [decorrentes da integra\u00e7\u00e3o do t\u00eaxtil num sistema de RAP]\u201d. Ou seja, a fast-fashion<\/em> pagaria a integralidade do ecovalor, ao passo que um artigo comprovadamente dur\u00e1vel poderia ser exonerado. Em Fran\u00e7a \u00e9 isso que acontece. Os t\u00eaxteis (e cal\u00e7ado) que obedecem a crit\u00e9rios de durabilidade beneficiam de abatimentos, sendo que a integra\u00e7\u00e3o de pelo menos 15% de mat\u00e9ria-prima reciclada d\u00e1 direito a 50% de redu\u00e7\u00e3o no ecovalor.<\/p>\n A entrada em vigor do esquema RAP em Fran\u00e7a, em 2009, permitiu aumentar consideravelmente a recolha seletiva. Antes da RAP, estimava-se que a quantidade de roupa e cal\u00e7ado recolhidos seletivamente (por organiza\u00e7\u00f5es privadas) correspondia a 20% da totalidade de material t\u00eaxtil colocada anualmente no mercado. Em 2019, essa percentagem ter\u00e1 chegado aos 41%. (1)<\/p>\n Falta precisar que, depois do estudo (final de 2022) e da formula\u00e7\u00e3o da lei (final de 2024), \u00e9 preciso contar mais dois anos (final de 2026) at\u00e9 \u00e0 entrada em vigor da RAP para o t\u00eaxtil em Portugal.<\/p>\n Muito t\u00eaxtil e pouco mercado<\/strong><\/p>\n Enquanto o esquema aguarda formula\u00e7\u00e3o legal, os SGRUs (Sistemas de Gest\u00e3o de Res\u00edduos Urbanos) j\u00e1 come\u00e7aram a estudar a mat\u00e9ria. Se o atual funcionamento do fluxo de embalagens pode servir de modelo ao futuro esquema do t\u00eaxtil, caber\u00e1 aos SGRUs a recolha seletiva e a triagem do novo fluxo, mediante transfer\u00eancias financeiras pagas pela futura entidade gestora (ou entidades gestoras). A Res\u00edduos do Nordeste, empresa intermunicipal que serve 13 munic\u00edpios em Tr\u00e1s-os-Montes, regista elevado teor de res\u00edduos t\u00eaxteis nos res\u00edduos indiferenciados que recolhe: 9%, o dobro da m\u00e9dia nacional. Nesta regi\u00e3o de baixa densidade populacional n\u00e3o abundam os contentores para doa\u00e7\u00e3o de roupa. E muitos dos materiais identificados (tapetes, alcatifas, estofos de sof\u00e1) n\u00e3o poderiam, note-se, ser valorizados por essa via.<\/p>\n A situa\u00e7\u00e3o preocupa B\u00e1rbara Rodrigues, respons\u00e1vel pelo Departamento de Qualidade, Ambiente e Seguran\u00e7a da Res\u00edduos do Nordeste, sobretudo porque nas atuais condi\u00e7\u00f5es de mercado estes t\u00eaxteis n\u00e3o t\u00eam valoriza\u00e7\u00e3o poss\u00edvel. A respons\u00e1vel relata que a empresa tentou, em 2019, montar um projeto de valoriza\u00e7\u00e3o do fluxo t\u00eaxtil. No entanto, n\u00e3o foi poss\u00edvel identificar empresas interessadas em absorver os t\u00eaxteis p\u00f3s-consumo que viriam a ser recolhidos seletivamente. Potenciais problemas de contamina\u00e7\u00e3o e a m\u00e1 qualidade das fibras foram as raz\u00f5es apontadas pela ind\u00fastria de componentes para os interiores de autom\u00f3veis, importante consumidora de desperd\u00edcios t\u00eaxteis mas que prefere ir busc\u00e1-los a montante, \u00e0s f\u00e1bricas, ainda limpos.<\/p>\n <\/p>\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n\n <\/p>\n\n\n <\/p>\n Esta experi\u00eancia levanta uma quest\u00e3o fundamental: o que vai acontecer aos t\u00eaxteis que vierem a ser recolhidos seletivamente? Se a Res\u00edduos do Nordeste n\u00e3o conseguiu fechar o ciclo dos t\u00eaxteis, quais ser\u00e3o as op\u00e7\u00f5es da futura entidade gestora deste fluxo espec\u00edfico?<\/p>\n