Reparação artigo

Uma revisão compreensiva dos sistemas de incentivo atuais à reparação: fundos de reparação e vouchers 

O artigo abaixo foi traduzido e resumido para português do original para nos dar uma melhor compreensão sobre os sistemas de incentivos à reparação utilizados em vários países europeus e que têm tido muito sucesso! Esperemos que este conteúdo sirva de inspiração para o que também se pode fazer em Portugal em matéria de promoção da reparação, uma estratégia fundamental da economia circular. Temos bons exemplos, muita informação sobre estes sistemas, vontade e necessidade e da sociedade civil. Só falta mesmo vontade política!

Todos estão a falar dos vouchers de reparação

“Salvar recursos, deveria compensar!” No ano passado, mais de 71.000 pessoas, com o apoio da Runder Tisch Reparatur, a Injusta Network e outras organizações da sociedade civil, exigiram um voucher de reparação ao Governo Federal Alemão. Com o objetivo de tornar as reparações mais #acessíveis e #compensadoras, as instituições europeias também propuseram o estabelecimento de “fundos de reparação” nacionais, nos quais os vouchers de reparação podem ser uma oportunidade.

Um voucher de reparação é um incentivo financeiro introduzido por municípios, governos federais ou nacionais para encorajar os cidadãos que possuem itens danificados ou avariados a reparem-nos em vez de os descartarem e os substituírem por novos. Tipicamente, o esquema do voucher de reparação inclui apoio financeiro ou descontos nos serviços de reparação. Estes podem ser em forma de subsídios diretos, descontos ou vouchers. A introdução destes mecanismos tem o potencial de fortalecer a sensibilização para um consumo sustentável e promover o uso prolongado dos produtos. 

Ainda que os objetivos dos sistemas de reparação sejam similares, a sua implementação varia de diversas maneiras: valor máximo do financiamento; produtos elegíveis e tipo de reparações; critérios de certificação para workshops de reparação ou a fonte do financiamento. Existem, assim, diversas abordagens para aumentar a cultura da reparação e promover a economia de reparação local. 

Este artigo pretende explicar de forma compreensiva o estado atual dos vários sistemas financeiros de incentivo à reparação na Europa. Para além de comparar os sistemas, também fornece uma visão geral das experiências e ajustes feitos até à data, o que pode ser muito útil para os stakeholders que estão a planear introduzir um sistema deste tipo. 

Informação Básica

LocalizaçãoData inícioProdutos elegíveisValor financiamentoPor Pessoa
ÁustriaAbril 2022Equipamentos elétricos e eletrónicosMáximo 200€ ou 50% do valor da fatura (e 30€ para estimativa do custo)Sem limite
FrançaDezembro 2022Alguns equipamentos elétricos, roupa e sapatosDependendo do tipo de equipamento entre 7€ e 50€. Por exemplo: 10€ para reparar uma cafeteria elétrica e 50€ para reparar um portátilSem limite
Turíngia (Alemanha)Junho 2021Equipamentos elétricos e eletrónicosMáximo 100€ ou 50% do valor da fatura (valor mínimo da fatura: 50€ e para Repair Cafés 25€)Máximo 100€ por ano
Saxônia (Alemanha)Novembro 2023Equipamentos elétricos e eletrónicosMáximo 200€ ou 50% do valor da fatura (valor mínimo da fatura 75€)Até 2 reparações por ano
Starnberg (Alemanha)Janeiro 2022Equipamentos elétricos e eletrónicosMáximo 50€ ou 20% do custo de reparação50€ por ano 
Viena (Áustria)Outono2020Todos os itens reparados pelos serviços de reparação que pertencem à Rede de Reparadores de Viena, excluindo Equipamentos Elétricos e EletrónicosMáximo 100€ ou 50% do valor da fatura e máximo de 55€ do valor para estimativa do custo de reparaçãoSem limite
Graz (Áustria)2017Custos para Repair CafésAté 2023: reparações de equipamentos elétricos e acumuladoresAté 1200€ por Repair Café por ano civilAté 2023: máximo 100€ ou 50% do custo do valor da fatura(2) Até 2023: máximo 100€/ano
Aschaffenburg (Alemanha)2024Equipamentos elétricos e eletrónicosCustos por organizar Repair Cafés20% do valor da fatura até ao máximo de 50€ por reparação50€ por cada dia a operarAté 2 reparações por ano

Fonte de Financiamento e duração do projeto

DuraçãoFonte financiamentoOrçamento anual/totalOrçamento por pessoa/por ano
ÁustriaVouchers podem ser usados até haver financiamento disponível. Data limite: 31.03.2026PRR- falta aqui coisas do original, não sei se foi propositado 130 milhões de euros durante 4 anos (equivalentemente a 32,5 milhões por ano)3,63€
FrançaA decorrerTaxas imputadas à Responsabilidade alargada do produtor2022: 22 milhões2023: 41 milhões2022: 0,32€2023: 0,61€
Turíngia (Alemanha)O terceiro período de financiamento terminou em dezembro 2023. Novo período começou em 2024Orçamento do Ministério da Energia, Proteção Climática Ambiente e Agricultura2021: 500.000€2022 e 2023: 875.000€2021: 0,23€2022/2023: 0,41€
Saxônia (Alemanha)Novembro 2023 até Dezembro 2025Orçamento do Ministério da Energia, Proteção Climática Ambiente e Agricultura1.25 milhões de euros por ano0,31€
Starnberg (Alemanha)Desde janeiro 2022Orçamento da Empresa Gestora de Resíduos de Starnberg2022: 5000€ para indivíduos e 3000€ para Repair Cafés0,22€
Viena (Áustria)Outono 2023 – 2027 (durante períodos de campanha)Orçamento do Município1,25 milhões (250.000€ por ano)0,13€
Graz (Áustria)Até Dezembro de 2023. O fundo deixa de estar disponível enquanto houver fundo semelhante a nível federal
Aschaffenburg (Alemanha)2024 (até se esgotar o fundo)Orçamento do Município6000€ 1500€0,09€

Recomendações

Programas de financiamento de reparação estão a ganhar popularidade por toda a Europa e a receber muito feedback positivo por parte da população. Em particular, os sistemas que estão a ser implementados há muitos anos na Áustria e em Turíngia permitem-nos formular algumas recomendações úteis para outras cidades, regiões ou países que também desejem implementar estes sistemas:

  1. Montante apropriado do financiamento: para criar um efeito de incentivo através dos bónus de reparação e garantir que o esforço administrativo é razoável face ao valor total, o fundo deve ser suficientemente elevado. Por exemplo, em Turíngia, o valor médio de 75€ por reparação foi considerado como montante a financiar. Em França, o valor do financiamento por produto cresceu após alguns meses para aumentar o incentivo da utilização do sistema.
  2. Poucas barreiras à entrada dos Negócios de Reparação: para assegurar que existem oportunidades suficientes para aproveitar o voucher, os critérios para que os serviços de reparação possam participar devem ser limitados ou inexistentes. Uma avaliação mais profunda do fundo de reparação francês concluiu que o esforço e os custos para os serviços de reparação podem ser dissuasores, sobretudo para pequenos negócios.
  3. Previsibilidade para os Negócios de Reparação: este aspeto é crucial quando existe um aumento do número de pedidos devido à introdução destes sistemas, e quando se trata de contratar mais colaboradores. A suspensão a curto prazo ou uma diminuição inesperada dos pedidos pode levar a grandes dificuldades, como demonstrou um exemplo em Viena, no qual a empresa teve de declarar falência. Assim, um programa estável é essencial para prevenir este tipo de situações.
  4.  Fácil implementação do processo: a existência de muitas dificuldades de acesso ou participação dos consumidores deve ser evitada ao máximo. Haver um processo digital provou ser muito bem sucedido em vários sistemas. Na Saxônia, por exemplo, observou-se que a necessidade de assinatura eletrónica foi um obstáculo para alguns clientes. Assim, é necessário ter em atenção que o processo de verificação deve ser o mais simples possível. Ao mesmo tempo, é preciso ter em atenção aspetos relacionados com processo de submissão, custos e segurança. 
  5. Mapa de Reparadores: introduzir um mapa deste tipo, como se fez na Saxônia e em França, levou a uma maior visibilidade dos serviços de reparação. Este mapa deve continuar a existir mesmo que o fundo termine pois é uma fonte de informação muito importante para os cidadãos. O mais importante é que o mapa esteja atualizado para garantir que a informação está correta.
  6. Prevenção de fraude através de processos de submissão claros: experiências vindas da Áustria demonstram que o processo deve ser desenhado para minimizar os casos de fraude. Desta forma, o processo de reembolso foi alterado e é feito diretamente ao cliente e não ao serviço de reparação. Assim, tenta-se garantir mais transparência e integridade.
  7. Financiamento através da Responsabilidade Alargada do Produtor: esta recomendação evita que o financiamento destes sistemas recaiam sobre o erário público e promovem que sejam sistemas de incentivo de longo prazo. 
  8. Recolha de dados: é muito importante recolher dados para se calcular a poupança de emissões e potencialmente ajustar e otimizar o programa. Para além disso, os dados sobre os produtos reparados podem ser úteis para a implementação e avaliação de medidas futuras para a promoção da reparação.

Conclusões

Todos os programas nacionais e subnacionais que conferem apoio financeiro à reparação alcançaram resultados muito positivos. Estas são ferramentas essenciais para sensibilizar os consumidores sobre a possibilidade de reparar os seus objetos e promover a decisão de reparar. Por exemplo, em França, após a implementação do fundo da reparação, mais de 165.000 reparações tinham sido feitas através do programa; e, desde a introdução dos vouchers da reparação, mais de 840.000 vouchers foram pagos na Áustria. No geral, os consumidores responderam de forma muito positiva a estas medidas.

Os subsídios para os custos de reparação podem levar à redução da procura de novos produtos, assim, reduz o impacte ambiental do nosso consumo. Isto é especialmente verdade quando estes incentivos são combinados com outras medidas como o combate/eliminação das barreiras estruturais e a promoção de um mercado da reparação justo e de fácil acesso. Só quando a reparação for mais atrativa e barata do que comprar produtos novos, sem a ajuda de subsídios financeiros, podemos mudar de forma sustentável o nosso consumo de recursos.

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