É nesta estrada que a CEP, através do projeto Repair Café, tem vindo a tentar servir de inspiração e a promover a (auto) reparação há mais de 8 anos. Outra mulher, Martine Postma, criou o conceito em 2009 e o mundo da reparação nunca mais foi o mesmo! Atualmente, existem mais de 3000 RC pelo mundo unidos através da organização Repair Café Network.
Repair Café – Festival Ativa Maio 2024
No geral, Rosie tem razão em todos os pontos que expõe no seu artigo e é de louvar o mea culpa que faz do impacte que a sua própria empresa tinha e tem. No entanto, Rosie explora a inversão do papel do consumidor para se tornar um proprietário, trazendo assim a devida responsabilidade e, consequentemente, maior cuidado e apreço pelas coisas que estes compram. No entanto, Rosie esquece-se que os verdadeiros proprietários são as empresas. São elas que desenham, escolhem os materiais, fabricam, transportam e vendem os produtos. Como podemos pedir aos consumidores-proprietários que usem mais e melhor os seus produtos quando não têm poder e informação sobre como as coisas foram produzidas e se não conseguem, podem ou são mesmo impedidos de os reparar, atualizar ou reutilizar, entre outros R´s. Estas práticas desenvolvidas pelos verdadeiros proprietários impedem os cuidados que ela menciona. Estas práticas “empurram” os consumidores-produtores a adquirir de forma frenética e a preços completamente irracionais e injustos novos objetos – quer estes avariem ou não.
Assim, para nós, os proprietários são as empresas e os consumidores são, como promove a economia circular, utilizadores. Porquê? Porque na maioria dos casos o que se quer é utilizar o produto durante um período de tempo e não ser dono do produto. É racional – económica e ambientalmente – utilizar ou pedir emprestado um berbequim ou um equipamento de jardinagem – e não comprá-lo para ser utilizado 1 vez por ano.
E, esse sim, é o derradeiro ato radical. As empresas tornarem-se responsáveis pelos produtos que colocam no mercado e tomarem todas as medidas possíveis para aumentarem o tempo de vida útil do produtos através da reparação, reutilização, upcycling e/ou partilha.
A Comissão Europeia anda há anos a discutir e finalmente, aprovou o Direito à Reparação (aqui e aqui) – apesar dos constrangimentos e limites desta mesma legislação – e este pode ser um (grande) primeiro passo para promover ou mesmo obrigar as empresas a alterarem as suas práticas e, desta forma, permitirem aos utilizadores fazerem uso dos produtos de efetivamente circular. E, em Portugal? Para quando uma legislação que promova a reparação? Só quando for obrigatório? Não faz sentido.
Segundo Rose, “a mudança pode começar apenas com uma agulha e linha” (e nós concordamos e adicionamos) com uma chave inglesa e um multímetro também.
Nota: O artigo data de 25 de novembro de 2015, por isso Rose refere-se às épocas festivas.
Artigo:
Nesta época de festas, tenho uma resolução de Fim de Ano em nome do Planeta Terra: vamos todos tornar-nos ambientalistas radicais.
Isto parece um grande passo – mas não é. Tudo o que precisas é um kit de costura e um manual de reparações.
Como consumidores individuais, a melhor coisa que podemos fazer pelo planeta é manter as nossas coisas em uso. O simples ato de prolongarmos o tempo de vida da nossa roupa através do cuidado adequado e da sua reparação – assim evitando emissões de CO2, geração de resíduos e utilização de água.
Porque é que Reparar é um ato radical? Reparar algo que nós de outra forma iríamos deitar fora é inconcebível para muitos no auge do fast-fashion e do rápido avanço tecnológico, mas o impacto é enorme. Digo-vos como CEO de uma empresa de roupa que, apesar do compromisso profundo com a produção sustentável, ainda assim retiramos mais da Terra do que lhe devolvemos.
Nós vivemos numa cultura no qual a substituição é a rainha. Nós reparamos grandes itens como carros ou máquinas de lavar roupa, mas na verdade é mais fácil e barato comprar algo novo. Existem outras razões para evitar a reparação, incluindo marcas que avisam os clientes que se estes tentarem reparar por conta própria a garantia fica sem efeito ou a falta de acesso à informação e partes necessárias para alguém reparar algo sozinho.
Estas condições criam uma sociedade de consumidores de produtos, não proprietários. E, existe uma diferença. Os proprietários são incentivados a ser responsabilizados pelas suas compras – desde a limpeza, reparação, reutilização e partilha. Já os consumidores tiram, produzem, descartam e repetem – um ciclo que nos está a levar à bancarrota (ou falência) ecológica.
Para ser sincera, o ato de comprar em si não é o problema (apesar de ser difícil não ver a loucura à volta de dias como a Black Friday).
Black Friday: From chaos to consumer celebration By Daily Sabah
Afinal, as nossas vidas dependem de uma variedade de produtos produzidos de uma forma que danifica o planeta – incluindo a Patagonia – e isto não parece que vá terminar em breve, não importa o quanto trabalhamos para reduzir o nosso impacte.
Qual o antídoto? Fazer uma redução na nossa pegada coletiva de consumo irá requerer uma responsabilidade partilhada entre as empresas que fabricam os produtos e os consumidores que os compram – mas as empresas devem atuar de forma independente.
Demasiadas vezes, os produtos não têm manuais de reparação – e em casos extremos as empresas impedem ativamente a reparação ao inventarem novos tipos de parafusos (só disponíveis pela marca) ou outras estratégias sem sentido. Isto deveria ser considerado inaceitável dada à crise climática que enfrentamos – mas, em vez disso, a obsolescência planeada é celebrada como uma estratégia de marketing inteligente.
Vamos comportar-nos como proprietários, e não como consumidores, e, reparar em vez de infligir algo novo ao planeta, se realmente não precisamos do produto.
E, enquanto negócios, temos a responsabilidade de fabricar produtos com mais qualidade e ajudar a reclamar o ato de propriedade: tornar as peças acessíveis e a reparação fácil. Vamos celebrar sempre o esforço de tentarmos reparar algo. Precisamos permitir que os nossos consumidores se tornem proprietários – e isso exigirá uma mudança sísmica na nossa abordagem.
É um ato radical, mas a mudança pode começar apenas com uma agulha e linha.